Dissertação sob ataque: como a jornalista Paula Litaiff virou alvo de perseguição em meio à disputa política e midiática na Amazônia
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Investigação judicial sobre a dissertação de mestrado de Paula Litaiff revela um contexto de intimidação sistemática contra jornalistas na Amazônia e expõe a escalada de tensões entre veículos locais, como Revista Cenarium e Portal CM7.
Manaus (AM) – A jornalista Paula Litaiff, fundadora da Revista Cenarium, está no centro de uma polêmica que extrapola os limites da academia. Sua dissertação de mestrado em “Sociedade e Cultura na Amazônia” — ainda em fase de finalização na Universidade Federal do Amazonas (UFAM) — passou a ser questionada judicialmente por atores ligados ao setor de mídia local. Mas os bastidores desse embate apontam para algo mais grave: um histórico de perseguição articulada, violência simbólica e institucional, e tentativas reiteradas de silenciar vozes críticas na imprensa amazônica.
De pesquisadora a alvo
O foco das investidas seria o conteúdo da dissertação, que trata de comunicação, gênero e poder no jornalismo regional. Mas a tentativa de deslegitimar o trabalho acadêmico de Litaiff ocorre em paralelo a uma série de ataques pessoais e profissionais que ela vem sofrendo desde 2022. O caso mais emblemático ocorreu em novembro de 2024, quando áudios vazados atribuídos a Cileide Moussallem, CEO do portal concorrente CM7 Brasil, revelaram ameaças de morte contra Paula e suas filhas menores.
“Vou contratar pistoleiros para resolver isso”, dizia um trecho do áudio amplamente divulgado por veículos nacionais e denunciado por entidades como a Abraji e a FENAJ.
Guerra entre redações
O conflito entre os dois veículos, Cenarium e CM7, vai além das diferenças editoriais. Enquanto a Revista Cenarium adota uma linha progressista, com foco em direitos humanos e jornalismo investigativo, o Portal CM7 Brasil atua com uma estética mais popular e vinculações informais a grupos políticos conservadores do Amazonas.
Em 2019, o CM7 foi condenado judicialmente a excluir conteúdos considerados falsos e difamatórios contra Litaiff, e Cileide foi posteriormente condenada a pagar indenização por danos morais à jornalista. Ainda assim, os ataques não cessaram: em janeiro de 2025, Cileide foi indiciada por injúria, difamação e ameaça de morte após o vazamento dos áudios. A investigação foi encaminhada à Justiça.
A máquina política por trás da mídia
Não é coincidência que a disputa midiática esteja entrelaçada com interesses políticos. Cileide Moussallem tem histórico de atuação político-partidária: foi candidata a deputada estadual pelo PHS (hoje incorporado ao Podemos) e, em 2023, filiou-se ao PP — legenda ligada a nomes do centrão.
Além disso, seu filho, Rômulo Moussallem, ocupa um cargo comissionado na Câmara Municipal de Manaus, com salário de aproximadamente R$ 6.900 mensais. A nomeação partiu do vereador David Reis (Avante), figura com histórico de articulação com o grupo político de Moussallem. Antes disso, Rômulo já havia sido exonerado de cargo semelhante na Assembleia Legislativa do Amazonas.
Um padrão de silenciamento na Amazônia
Paula Litaiff não está sozinha. A região amazônica é uma das mais perigosas para o exercício do jornalismo no Brasil, segundo dados da FENAJ e da Repórteres sem Fronteiras.
Casos recentes incluem:
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José Francisco Silva de Araújo, jornalista de Iranduba, ameaçado por número vinculado ao prefeito da cidade.
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Repórteres da TV Norte Amazonas (SBT), agredidos fisicamente durante cobertura eleitoral.
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O repórter Alex Braga, do AM Diário, atacado após denunciar corrupção.
A tentativa de deslegitimar o pensamento crítico
O questionamento da dissertação de Paula Litaiff — um processo interno e acadêmico — passa a ser instrumentalizado fora do ambiente universitário como mais uma ferramenta de perseguição política e pessoal. A tentativa de descredibilizar sua produção científica se alinha a uma estratégia mais ampla de assédio judicial e moral, comum em regimes hostis à liberdade de imprensa.
"Esse tipo de ataque não visa apenas a Paula, mas o próprio direito de pensar criticamente a realidade amazônica", afirma um professor da UFAM, sob condição de anonimato.
Conclusão:
O caso de Paula Litaiff exemplifica como as trincheiras da política, da imprensa e da academia se sobrepõem perigosamente na Amazônia, especialmente quando o jornalismo decide enfrentar o poder. Ao invés de debate democrático, o que se vê é a judicialização do pensamento, a criminalização da crítica e a privatização dos espaços públicos por grupos que confundem mídia com máquina de guerra.
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